terça-feira, 7 de maio de 2013

Dica literária: O apanhador no campo de centeio

Essa dica é para os carajosos.
O apanhador no campo de centeio é meu livro favorito. O personagem principal é pra lá de complexo e o modo como Salinger escreve é genial.
Mas é preciso cautela para lê-lo.
O apanhador no campo de centeio é famoso entre os teóricos de conspiração e investigadores de cenas criminais, por dois famosos fatos: O assassino de John Lennon estava lendo este livro quando matou o ídolo. Ele ia se matar, mas decidiu matar o John.
Outro fato é que o quase-assassino de Ronald Reagan (Esse não conseguiu cumprir o crime) também estava lendo o livro quando tentou cometer o crime.
Não me surpreenderia se centenas de jovens estivessem lendo esse livro antes de cometerem suícidio.
O apanhador no campo de centeio é deprimente como o inferno.
Mas mesmo assim, é muito bom.
Talvez seja o jeito de Salinger escrever, que eu acho genial. Mas também acho que possa ser pelo personagem principal: Holden Caulfield.
Ele é tido como um ícone da rebeldia juvenil, com razão, no entanto, ele não é o típico otário das escolas, que bagunça no fundo da sala, nem o emo depressivo e virgem que se corta no banheiro, ele tá mais para um cara normal do que para um esterótipo qualquer.
Holden é o que eu chamo de "adolescente de classe média de verdade", ele sai com garotas, se diverte, dá uns beijos, uns amassos, é virgem, fuma, bebe e está perdido no mundo.
Ele não sabe o que fazer da vida e eu acho que é aí que as pessoas se identificam com ele. Por mais que um cara de 15 anos diga o que quer ser quando crescer ou como ele se imagina com 10 anos, ele não tá ligando muito pra isso.
Na verdade, ninguém está realmente se importando com isso, ou melhor, se importa, mas não quer se importar. Crescer é um saco, todo mundo sabe disso, ninguém quer trabalhar oito horas por dia, viver com um salário medíocre, viver cercado de sorrisos falsos e vidas vazias.
Ninguém quer isso.
Mas nós sustentamos uma imagem de pessoas moldadas, acostumadas com o mundo em que vivemos, mas por dentro temos raiva e queremos viver em outro lugar, de outro modo, fazendo algo qualquer que não isso. E é isso que os adolescentes buscam, viver de outro jeito, escapar dessa tortura moldada pela sociedade, pelo sistema capitalista e pelo maldito governo que quer crescer a economia, sem parar.
Não tem um fim para essas coisas, mas a nossa vida sim.
E é aí que o Holden fica perdido e todo adolescente normal também... Ou não, talvez nem todo adolescente normal, eu sei que eu fico assim. Eu estou assim.
É fácil se identificar com Holden, mas é exatamente por ele nos mostar esse lado obscuro que cada um guarda dentro de si, que O apanhador no campo de centeio é perigoso, por que ele desperta cada ponto negativo do seu espírito e traz a tona com tudo e quanto mais você demora pra ler, mais deprimido você fica e não sabe realmente o por que.
Só agora, a terceira ou quarta vez que eu leio o livro é que percebi isso.
De fato, eu to deprimido pra caramba, mas não é culpa de O apanhador no campo de centeio, é culpa desse mundo maldito em que vivemos presos.
Na minha opinião é exagerado o livro ser banido por ter conteúdo obsceno ou algo assim, esse livro parece um conta da carochinha perto de "O Cortiço", por exemplo e aliás, nem tem tantos relatos sexuais no livro, até por que Holden é virgem. Ele só fala uns palavrões e fala umas coisas meio obscenas, mas não não é nada explícito ou que atrapalha a leitura, são só coisas de adolescente, dá até pra deixar os pais lerem.
Só pra te colocar a par da história: Holden acabou de ser expulso de mais um colégio particular. É quase Natal e ele só pode voltar para casa na quarta-feira, mas ele fica de saco cheio de todos os cretinos que ele tem que suportar na escola, por isso faz as malas e foge.
Ele sai do colégio com o bolso cheio de dinheiro, até aí ele já conversou sobre a vida com um professor, já filosofou um monte sobre um perdedor espinhento do seu dormitório e xingou um monte um musculoso que divide o quarto com ele.
Depois o livro acaba virando um relato em primeira pessoa de alguns dias na vida de Holden Caulfield, onde ele se encontra com freiras, com a mãe de um cretino do seu colégio, com uma puta, briga com um cafetão, paquera umas meninas, sai com uma garota cretina, mas que tem um bumbum bonito, com um professor, mais uma penca de pessoas e por fim a sua irmã, a única pessoa que parece não ser uma tremenda cretina nesse mundo.
É aí que pega, Holden consegue achar cretinice pra todo lado e fica odiando todo mundo, menos a sua irmã, mas se você for analisar as pessoas com quem vivemos, ninguém é do jeito como gostaríamos que fossem e isso deprime bastante o leitor, pelo menos me deprime.
O final até parece meio forçado, mas surpreende e se você ler outras obras de Salinger (Só contos, por que ele só escreveu esse livro) perceberá que esse é o seu estilo; um final perturbador, aberto, surpreendente e fantástico.
Então, essa é a dica de hoje: O apanhador no campo de centeio, mas fica o alerta, esse livro é deprimente pra caramba. Fica por sua conta e risco.
Spoiler: A última linha do livro é: "Nunca conte nada a ninguém. Se você o fizer, começará a sentir falta de todos"