domingo, 27 de setembro de 2015

Dica cinematográfica: "Réalité" de Quentin Dupieux (2014)

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Quentin Dupieux é um artista francês que usa a alcunha Mr. Oizo para criar música eletrônica. De "cara limpa", ele se apresenta como um diretores mais criativos em atividade. Rubber foi o filme que o apresentou ao mundo, usou do gore, o humor negro e o trash para criar um filme cheio de camadas que até hoje surpreende as pessoas. Wrong não seguiu o mesmo caminho de Rubber, mas segue na linha própria de Dupieux, onde as coisas acontecem por nenhuma razão, fortalecendo esse gênero que existe em si mesmo. Wrong Cops foi onde ele errou a mão, decepcionando um pouco, mas não é descartável, embora não seja admirável, de forma alguma. Em "Réalité", Quentin Dupieux cria o seu melhor filme até agora, dando um passo além do elemento principal do gênero que ele deu origem.

O filme conta a história de Jason, um cameraman que passou dois anos criando um filme de terror. Quando ele finalmente o termina, decide apresentá-lo a um produtor poderoso, que adora a ideia, mas diz que Jason esqueceu de um elemento importante para o seu filme: o "grito". Então, Jason sai a procura do "grito perfeito" para o seu filme, num prazo de 48 horas.

A sinopse faz o filme parecer mais simples do que ele é, embora se apresente muito verossímil até uns 30 minutos de filme, em que somos apresentados a diversos personagens que compõem toda a história. Personagens que surgem como principais da história, depois são revelados como personagens compêndios para apresentar de forma original os personagens principais. Cada qual existindo isoladamente em seu próprio universo, sua própria realidade.

O problema é que as diversas realidades começam a se misturar, numa cena que requer um certo conhecimento anterior do espectador para saber em que hora o filme está quebrando a quarta barreira, gerando uma metalinguagem (só para explicar, um ano antes do lançamento desse filme, foi lançado um filme italiano com o mesmo nome, com estreia no mesmo festival no qual esse filme estreiou, mas Quentin Dupieux já havia terminado o roteiro, estava filmando e não se importaria nem um pouco com isso, mas achou legal fazer uma piada interna no meio do filme) típica de todos os filmes do diretor.

No final, é um filme confuso, que precisa ser assistido mais de uma vez para que você comece a entendê-lo, mas eu conheço o Quentin Dupieux e sei que não faz sentido tentar achar sentido em seus filmes, afinal, há todo momento, você consegue ver o elemento mais importante do cinema em suas cenas, diálogos e jogos de metalinguagem: o "No Reason".

5 pontos

Dica literária: "Planetes #2" de Makoto Yukimura

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Seguindo a fórmula clássica de história de ficção científicas, Makto Yukimura nos guia pelo universo a ser desbravado de Planetes pelos olhos de Hachimaki, que ganha mais profundidade nesse volume, com uma história que ainda tem muito a crescer.

Neste volume, uma empresa de exploração espacial inicia um concurso para definir pilotos que terão a oportunidade de desbravar Vênus pela primeira vez, numa missão que durará ao menos 7 anos, com um treinamento de muitos meses. Hachimaki, que tem o sonho de conseguir muito dinheiro, muitas horas de EVA (um termo para dizer que ele viajou muito numa nave espacial) e finalmente ter sua própria espaçonave para poder viajar para onde quiser no universo se inscreve, mas surgem diversos empecilhos; de um grupo terrorista anti-exploração espacial ao seu próprio pai, que se transforma em seu concorrente.

Aqui, notamos a genialidade de Makoto Yukimura. Apesar de Planetes ter um universo infinito a sua disposição, não há muito a ser explorado, devido ao realismo da história (sem aliens, UFO's e poderes mágicos), portanto muito já havia sido apresentado no primeiro volume. Para este segundo volume, então, ele decide nos aprofundar no personagem mais próximo da realidade do autor, o japonês Hachimaki, que tem seus próprios problemas em casa, suas responsabilidades e problemas. Tudo isso não chega a se resolver neste volume, mas eu não acho que dará para o autor se aprofundar muito mais nos próximos volumes (já comprei o terceiro e estou curioso).

Vale a pena dizer que este volume tem uma bela homenagem/referência a "2001:uma odisseia no espaço" no último capítulo (eu acho).

Enfim, o segundo volume de "Planetes" não decepciona, entretêm e se torna uma leitura bem rápida, pelo caminhar das situações e problemáticas, mantendo o mesmo nível de excelência do primeiro volume.

4 pontos

sábado, 26 de setembro de 2015

Dica musical: "Momentary Masters" do Albert Hammond Jr.

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O novo álbum do Albert Hammond Jr. (é o terceiro se não me engano) é uma viagem nostálgica e gostosa aos bons tempos do indie rock lá na primeira década dos anos 2000.

De fato, esse álbum soa como um álbums dos The Strokes, pode se dizer que seria o caminho que a banda seguiria não fosse o Julian Casablancas estragando tudo com suas péssimas influências pop (Morra música pop!), aqueles falsete estranho e os toques eletrônicos ridículos e fora do lugar.

Já aqui não, as influências pop são boas, os toques eletrônicos combinam com as músicas dando fôlego a atmosfera que Albert quer criar, seja ela mais melancólica ou algo mais dançante, embora o álbum não seja dançante, em sua totalidade.

De fato, esse é um álbum gostoso de ouvir numa manhã chuvosa (como essa em que eu estou escrevendo esse texto) ou numa madrugada tranquila pós-balada. As primeiras músicas podem te animar, botar um sorriso no rosto e te animar para o que vem por aí ou podem te fazer pensar na vida, nos seus amigos e rolos, até que uma lágrima escorra pela sua bochecha direita.

"Momentary Masters" é um álbum que evoca todos aqueles sentimentos juvenis que os hipsters dos anos 2000 sentiam, aquela vibe nova-iorquina que tomou conta do mundo todo, mas com um pouco mais de maturidade, puxando influências de grupos como Arctic Monkeys, The Killers (por que não?) e alguns gêneros que eu conheço menos, como o folk e seu tesão pela natureza, fazendo de Albert isso mesmo, um mestre momentâneo, numa onda momentânea de nostalgia gostosa.

Vale a pena escutar.

3 pontos e meio

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Dica cinematográfica: "O samurai" (1967)

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Nenhum filme que cite o Bushido pode ter um final feliz.

"O Samurai" conta a história de um matador chamado Jef Costello, um perfeccionista por natureza e, que por esse motivo, nunca foi pego. No entanto, após finalizar mais um serviço, é surpreendido por uma testemunha e, aos poucos, ele vai sendo pressionado, tanto pela polícia, quanto pelos seus contratantes e até as pessoas em que ele confiava.

Esse filme foi feito pro Jean-Pierre Melville, um gênio do cinema, que ajudaria a dar vida à Nouvelle Vague, servindo de inspiração para Godard criar "O Acossado" e "O pequeno soldado". Este filme é fortemente influenciado pelo cinema noir, contando com um perfeccionismo cinematográfico raramente visto antes dele.

A história se desenrola como um pergaminho, novas possibilidades são abertas, enquanto outras se fecham, mas, logo no começo (se você já assistiu Cowboy Bebop e outras obras orientais) você já sabe como será o final. De fato, é um filme com amplas inspirações da terra do sol nascente, seja na narrativa, rápida e em constante evolução, seja nos elementos visuais (Akira Kurosawa já havia lançado Nora Inu à época de lançamento desse filme).

Para mim, como fã confesso de filmes noir, nouvelle vague e cinema oriental, esse filme chegou até mim como um soco na cara (como eu não conhecia Jean-Pierre Melville), dizendo que eu sou um idiota e estou na ponta do iceberg ainda. De qualquer forma, esperem mais filmes desse gênio.

4 pontos e meio

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Dica literária: "Uma História Meio Que Engraçada" de Ned Vizzini

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Um dos meus filmes favoritos ("Se enlouquecer, não se apaixone") foi baseado nesse livro. Finalmente, ele chegou ao Brasil, para a nossa alegria.

"Uma História Meio Que Engraçada" relata os dias em que Craig Gilner, um garoto de classe média do Brooklyn, ficou internado na ala psiquiátrica de um hospital, por que queria se matar. E os motivos que o levaram até lá. É uma história simples, meio que engraçada, sobre depressão e o que fazer para lidar com ela, mas não chega a ser um livro de auto-ajuda.

O livro foi escrito entre 2004 e 2005, alguns dias após o autor, Ned Vizzini, sair da ala psiquiátrica de um hospital e todo o livro é narrado em primeira pessoa, no tempo presente (exceto os capítulos em que Craig relata os motivos que o levaram a ter depressão), então o livro adquire um certo caráter documental e fica difícil separar a ficção da realidade. Provavelmente, o autor passou por todas aquelas situações mesmo.

O título do filme, em português, é bem diferente do título do livro e aqui no Brasil, mantiveram a tradução do título o mais próxima do original possível e, após lê-lo, achei justa a diferença. Primeiro, por que o título do filme serviu apenas para ir na onda do filme "Se beber não case" (só por contar com um dos atores do filme) e, segundo, por que as duas obras são muito diferentes. O livro tem muito mais personagens, diversas situações diferentes, que só funcionam no papel mesmo, e abrange um espaço de tempo muito maior.

Embora (e aí reside a maior surpresa do livro) ele tenha um final tão eletrizante quanto o do filme, realmente te arrepiando e te colocando pra cima, dando um boost na sua auto-estima logo de cara.

O livro não chegou ao Brasil com nenhum tratamento especial, sua capa é mole as folhas são normais, iguais a muitos outros livros por aí (talvez um pouquinho mais grossas para dar volume ao livro, que é bem curtinho), então sem surpresas, tanto negativas, quanto positivas. Foi uma boa edição.

Enfim, se você está a fim de uma leitura leve e rápida, compre este livro, vale muito a pena e assista o filme, também é incrível.

3 pontos e meio

domingo, 20 de setembro de 2015

Dica cinematográfica: "Hacker" (2015)

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"Blackhat" é o mais novo filme de Michael Mann, um diretor que eu admiro bastante, apesar de compreender as críticas dirigidas a ele.

Nesse filme, é montado um thriller tecnológico, onde um hacker entra nos sistemas de uma usina nuclear chinesa, causando uma explosão no sistema de resfriamento. Shun, um policial que trabalha no setor de investigações tecnológicas (ou é o que eu imagino) é escalado como investigador principal do caso, contando com a ajuda de uma equipe do FBI. Shun descobre que o hacker terrorista usou um código que ele havia criado junto com um amigo seu dos tempos de faculdade no MIT. Nicholas Hathaway é o nome desse amigo e ele foi preso por usar seus conhecimentos em tecnologia para roubar centenas de milhares de dólares de banco. Juntos, eles começam uma investigação hyper realista e tecnológica que não deixa nada a dever a outros filmes parecidos. Um thriller policial com ótimas adaptações para os dias atuais.

Enfim, vamos aos pontos negativos, o roteiro não é bem feito, mas isso também não é culpa do Michael Mann. As relações entre os personagens poderiam ter sido melhor elaboradas (a relação amorosa de Nic com a irmã de Shun é ridícula, no começo), mas isso não é culpa do diretor, que fique claro. Chris Hemsworth não é um bom ator, nem adianta, ele não convence (o filme todo fiquei imaginando o que Jack O'Connel teria feito no lugar dele) e os outros atores, em consequência disso, não ganham tanto espaço, já que o fiilme se concentra em mostrar a história e alguns simbolismos muito fortes ao longo do filme.

Falando em simbolismos, chegamos à parte boa do filme. Muito da compreensão que se faz do filme é feita de forma subliminar, através de cenas sem falas, mas cheias de símbolos que mostram o que os personagens estão sentindo ou até mesmo fazendo. Isso fica claro quando Nic é solto e olha para o horizonte, desfocado, numa cena em que apenas metade de sua cabeça aparece. Acontecem outros momentos assim ao longo da película, que impressionam demais.

Outro ponto positivo, e isso é totalmente creditado ao Michael Mann, é a forma em que o filme foi filmado. Em tempos de tecnologia 4K e obsessão por imagens cristalinas, só Mann para filmar uma cena de ação com a dignidade que cenas de ação merecem, uma briga de bar, sem cortes na hora dos socos, com câmeras móveis e antigas, dando aquela granulação que todos amamos. Uma verdadeira cena de luta. Sem contar o jogo de câmeras em todas as outras cenas, detalhistas. Esse é o comportamento da câmera em todo o filme e isso fica definido já logo no começo do final, em uma cena de abertura genial, em que acompanhamos o movimento de bits que correm através de cabos, de servidores remotos até centros de comando. Genial.

Enfim, eu entendo as críticas feitas ao filme, mas o principal culpado por esse filme não ser um marco cinematográfico é o roteirista. Já Michael Mann, ele salvou esse filme, em muitos pontos, transformando num filme muito bom, bom mesmo.

4 pontos

sábado, 19 de setembro de 2015

Dica literária: "Turma da Mata - Muralha"

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"Turma da Mata - Muralha" é a mais nova graphic novel lançada pelo selo Graphic MSP este mês e encontrada facilmente, nas suas duas versões, no site da Mirane Comics (o melhor site de vendas de quadrinhos de toda a internet brasileira).

Nessa Graphic MSP, Arttur Fujita transforma a turma de animais pacíficos da mata do Chapadão numa história de ação e aventura com teor político, num cenário meio steampunk. A mistura ficou muito boa, criando um universo todo único, com potencial para muito mais. Roger Cruz (que é um ilustrador foda pra caramba) dá vida aos personagens, desenhando-os em seu estilo único, criando animais antropomorfizados, dando estilo para cada um deles (seja nas roupas, nas armas, até no cenário da história). Por fim, Davi Calil adiciona emoção, dá graça a tudo, com suas cores, muito boas por sinal.

De fato, essa poderia ter sido a melhor de todas as graphic MSP's, tendo um estilo artístico muito próximo de Astronauta e Piteco, mas há um defeito grande aqui, que é o próprio formato do livro. Como todas as Graphic MSP's, "Turma da Mata - Muralha" conta com o mesmo número de páginas de números anteriores (acho que são 76 páginas, se não me engano), com a diferença que aqui seus autores criaram um universo muito mais complexo e cheio de detalhes que outros volumes, detalhes que poderiam ter sido melhor explicados, relações que poderiam ter sido melhor elaboradas e cenas de ação que mereciam mais páginas, para que fossem completamente compreendidas.

Mas, conhecendo o histórico da Graphic MSP, dá para se esperar alguma continuação, até por que, se você prestar atenção, reparará que não há um final feliz e conclusivo, de fato, apenas um final mais cômodo, no entanto, ficam sérios problemas a serem resolvidos e eu não estou falando da muralha.

Enfim, "Turma da Mata - Muralha" tem seu defeito, mas não é culpa de seus autores, que fizeram um ótimo trabalho com  esse livro e mereciam mais espaço para elaborar sua história em sua totalidade.

3 pontos e meio

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Dica musical: "Selva Mundo" de Vivendo do Ócio (2015)

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O hype em torno do indie rock passou, infelizmente, há anos, mas Vivendo do Ócio continua dando uma sobre-vida muito boa a esse gênero, podendo ser classificada como a melhor banda desse gênero, não só por produzirem ótimas músicas, mas por se manterem fiéis ao gênero e continuar com o excelente padrão de qualidade.

"Selva Mundo" foi um álbum que contou com o apoio de fãs do Brasil inteiro através do Kickante e todo o Brasil está presente nesse álbum, apesar do amor ser declarado, em alto e bom som, apenas a Bahia.

O álbum começa com um indie rock típico, acelerado e bem dançante, mantendo esse ritmo pelas próximas músicas, mas logo vemos alguns toques poéticos, voltados ao Nordeste principalmente, seja em algum instrumento de percussão típico ou nos versos recitados ao final de algumas canções. E aí, na segunda metade do álbum, somos levados a uma viagem nostálgica pelas memórias de todos os membros da banda (em algum momento, todos eles cantam, separadamente, mas gerando unidade no álbum, como um todo), um salve a Bahia e às memórias de tantas noites passadas em claro, tocando, cantando, bebendo e se divertindo, vivendo a vida como se deve viver.

"Selva Mundo" conta com uma bela produção, é um álbum ousado, mas sem extrapolar os limites, fiel a sonoridade da banda (o que é muito importante em tempos de falta de identidade musical por grandes nomes da música, principalmente do rock) e pode ser tido como o melhor álbum da banda até agora. Banda, aliás, que deveria entrar no hall da fama do rock brasileiro, por que eles são muito bons. Bons demais. Bons mesmo.

Vida longa a Vivendo do Ócio.

4 pontos e meio

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Dica musical: "I'm a lazy son, but I'm the only son" de LOWER (2015)

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Seguindo uma linha parecida a da dica de ontem, apresento-lhe LOWER e seu excelente EP "I'm a lazy son, but I'm the only son".

Liricalmente, LOWER lembra em partes FIDLAR, por expor alguns dos anseios, preocupações e situações típicas de nossa geração, mas aqui o olhar é muito mais introspectivo e voltado para o indivíduo e não para a comunidade, o que gera uma visão mais ácida (se é que isso pode ser usado como adjetivo).

O som ajuda nisso. LOWER é uma banda de Copenhagem, mesmo local de bandas como Iceage e Marching Church, portanto espere um som sombrio, com uma bateria marcante, quase militar e um certo ar experimental obscuro, utilizando teclados e até trompetes para criar uma atmosfera sombria e, ao mesmo tempo, complexa.

Assim como outras bandas desse mesmo cenário musical, LOWER se rende ao experimentalismo, começando o álbum de maneira mais "clássica", apesar do teclados no começo. É um punk rock sombrio e obscuro típico, até que começa uma canção acústica, mas também obscura e sombria. O álbum termina com uma canção completamente experimental, com pianos, trompetes e coachar de sapos ao fundo. Basicamente um filme de terror com final ambíguo.

Enfim, é um álbum que vale muito a pena, apesar de ter apenas 5 canções. LOWER é uma banda a se manter um olhar atento, pois podem surpreender muito ainda.

4 pontos

domingo, 13 de setembro de 2015

Dica musical: "Too" de FIDLAR (2015)

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FIDLAR é uma banda de skatistas de Los Angeles, que faz um som meio post punk, meio noise, meio garage rock, enfim... Aquele som típico de bandas que surgiram na era pós-indie rock em Los Angeles (Wavves sendo a melhor de todas). Há um tempinho, eles lançaram um CD, mas eu não dei muito atenção e também não daria a este, não fosse pela mensagem que eles passam neste CD.

Você sabe que vai se identificar com a banda logo na primeira canção, quando o vocalista canta: "Todo mundo tem alguém, todo mundo, menos eu [...] todos tem dinheiro, por que alguém não me dá um pouco mais de dinheiro?". Basicamente, esse CD reúne todas as reclamações que a nossa geração (se você tem 20 e poucos anos, você sabe que geração é essa) tem feito a anos. Ter que trabalhar, estudar, apresentar uma boa imagem, sobreviver às pressões dos mais velhos e agora dos mais novos também, já que eles nasceram num mundo diferente do nosso, já nasceram conformados com essa triste realidade que vivemos. Nós pertencemos a uma geração diferente, que não está conformada, que viu as mudanças ocorreram, viram o final da boa era (ah, anos 90) e o começa de uma nova idade das trevas (era da informação o meu pau!). E alguns podem dizer que isso são lamentações de um bando de garotos mimados, principalmente, por que tomam essas coisas como opcionais, mas elas não são. A sociedade te dá duas opções: ou você tem um emprego ou mora em baixo da ponte, ou você mora sozinho ou é um perdedor, ou você tem uma namorada ou você é um viado ou você estuda ou você vai ter uma vida medíocre. Ou vive ou morre. Isso não é opção. Isso não é escolha. Isso é opressão.

Em "Too", FIDLAR expõe toda essa opressão com muita agressividade e velocidade, afinal, suas músicas são curtas e aceleradas, com ótimas guitarras distorcidas e um vocal gritante. Mas ao contrário do último CD, aqui eles não flertam com o noise, por que tudo é perfeitamente audível. Você consegue claramente diferenciar os vocais, das guitarras, do baixo e da bateria. A produção foi mais elaborada nesse disco.

Enfim, com uma mensagem forte e um som bem característico, que está sendo perdido (até o Wavves desistiu de seguir esse ótimo caminho musical), FIDLAR se levanta como um lutador solitário, um guerreiro só num campo de batalha, armado até os dentes e com sangue nos olhos. Ouça.

4 pontos

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Dica cinematográfica: "Blindness" (2008)

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"Ensaio sobre a cegueira" é um filme meio canadense, meio brasileiro, meio japonês... Enfim, tem gente do mundo todo nele, adaptação do livro homônimo escrito por José Saramago.

Uma cegueira branca (pois ao invés da clássica escuridão dos cegos, ela apresenta-se como um branco leite) começa a se espelhar pelo mundo e um grupo de pessoas, os primeiros infectados, é mantido de forma precária sob quarentena pelo governo. Aos poucos, a sociedade se colapsa do lado de fora e do lado de dentro, as coisas começam a ficar feias para todos os cegos. No entanto, uma mulher não foi afetada e revela-se a única forma de sobrevivência do grupo.

Este é um filme complexo, nem tentem achar respostas fáceis aqui. No entanto, também é um filme que entretêm muito. Há uma mescla muito boa entre essas duas forças; complexidade e entretenimento, que parecem se opor, mas aqui, mostram-se irmãs.

A primeira hora do filme passa num fôlego só, sendo intrigante e agitada, mantendo o suspense no ar o tempo todo. As perguntas não são respondidas, mas o filme quebra um pouco o suspense com momentos mais tranquilos, até que algumas situações resultam em momentos de tensão extrema, terminando em um alto grau de violência, mas sem os maneirismos estadunidenses (EXPLOSÕES!) que estamos acostumados. Tudo isso recheado de metáforas e frases profundas, que te  faz ficar pensando no significado por trás de cada uma das cenas e até cada uma das falas de seus personagens.

Nada parece ter sido colocado por acaso ali.

E então, ao terminar o filme, me senti profundamente instigado a ler o livro, pois se o filme já mostra ser complexo e profundo, o livro deve ter uma metáfora atrás de outra, um ensinamento em cada parágrafo e horas depois de assisti-lo, eu ainda me pegava pensando: "Caramba, que filme bom!"

4 pontos e meio

Dica musical: "The Story of Sony Boy Slim" de Gary Clark Jr. (2015)

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Gary Clark Jr. foi provavelmente o único guitarrista da última década a ser realmente levado a sério. Em 2012, ele lançou seu álbum de estreia, muito aclamado pela crítica pela sua sonoridade blues rock, elevando seu nome a um patamar acima de outros guitarristas, podendo ser uma espécie de Jimi Hendrix da nossa geração (de vez quando aparece um cara assim), mas neste segundo álbum, ele deu uma mudada em seu som, o que poderia ser encarado com muita negatividade por este que vos escreve, mas a mudança veio a calhar, criando um som complexo e todo original, dando mais força à obra que Gary Clark Jr. quis criar.

"The Story of Sony Boy Slim" é um álbum recheado de narrativas, lidando com diversos temas, desde amor e sexo (como de prache) até racismo (parece que todos decidiram tratar desse tema esse ano). Sua sonoridade revela o vasto repertório que Gary Clark Jr. usa como referência, tendo desde o blues mais puro feito com um violão até o funk, tocado em discotecas e o hip hop mais clássico.

Não é um álbum tão puro quanto seu antecessor e esconde um pouco o talento de Gary Clark Jr. na guitarra, mas é muito bem feito, cumprindo bem com sua proposta, de passar por todos os gêneros musicais dominados por negros e negras desde os primórdios da música contemporânea.

De fato, aqui Gary Clark Jr. parece trabalhar como um historiador ou professor, resgatando sons antigos, misturando-os e mastigando-os para melhor digestão de seus alunos/ouvintes.

É um álbum que vale a pena ser ouvido.

4 pontos

domingo, 6 de setembro de 2015

Dica musical: "Sound & Color" do Alabama Shakes (2015)

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Alabama Shakes é uma dessas bandas que ganha atenção do mundo hipster, tendo sido extremamente hypada entre 2012 e 2013. O problema é que o mundo do hype é geralmente injusto ("Don't Believe The Hype *sic*) e eu nunca achei o primeiro álbum deles bom de verdade, até por que não era algo inédito (The Black Keys e Kings of Leon se não foram os pioneiros, foram os primeiros a tocar nas rádios essa vertente a qual o Alabama Shakes pertence), nem era algo excelente (The Weeks produz o mesmo som, mas com uma qualidade lírica e musical infinitamente maior), no entanto, decidi dar uma chance a esse álbum e apesar de não ser um ótimo álbum, é um álbum a se ouvir.

Ao contrário do primeiro álbum, aqui nós encontramos uma variedade sonora maior, tendo alguns elementos eletrônicos adicionados às canções, além de mudanças contrastantes de sonoridade no meio de algumas canções. Suas raízes "sulistas" continuam vivas, tendo aquela influência gostosa da música country que faz com que todos amemos o Kings of Leon.

Outro ponto positivo é o bom humor da banda, que não trata seus álbuns como algo sério e complicado de se entender. Algumas canções foram feitas para soarem como versões ao vivo, com conversas e risadas ao fundo, outras são mais "profissionais". Tudo isso faz o som do Alabama Shakes soar casual (talvez casual demais?), sendo uma boa pedida para tocar em alguma festinha com seus amigos que gostam de beber e dançar ouvindo rock.

No entanto, continua sendo um álbum mediano, como o primeiro foi e o terceiro continuará sendo. Ao menos, este álbum não está sendo tão hypado como o seu antecessor (talvez as pessoas tenham percebido o que é o Alabama Shakes de verdade) e foi essa ausência de hype que me fez escrever essa dica hoje.

3 pontos

sábado, 5 de setembro de 2015

Dica musical: "Yours, Dreamily" do The Arcs (2015)

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Não tão marcante quanto a dica da semana passada, mas vale a ouvida.

The Arcs é o novo projeto de Dan Auerbach, do The Black Keys e como já é de se esperar, mantém uma sonoridade voltada ao blues, mas aqui ele dá uma mudada no som, para se adequar a proposta desse álbum, que é a de criar um mundo imaginário, um mundo nos sonhos, sonhos de algum rockeiro que curte blues, mas vive nos anos 80, uma década de neon, vivenciando o início da música eletrônica.

O blues do The Arcs não é cru como o The Black Keys. Tem uma pegada mais eletrônica, dando uma pegada mais conceitual no álbum (isso fica mais ou menos claro nas letras, que falam de mulheres, bebidas, corações partidos, enfim... o de sempre, mas disposto de uma forma meio caótica, como num sonho molhado, mesmo).

A comparação com o The Black Keys é inevitável, porém errônea, já que as bandas trilham caminhos diferentes, apesar de partirem da mesma premissa.

No final, você chega a conclusão de que é um álbum interessante, provavelmente dá um bom show ao vivo, mas não chega a ser tão memorável quanto outros álbuns de Dan Auerbach, apesar de ser muito bem vindo, pela diversidade sonora e a ousadia que esse álbum carrega.

3 pontos e meio