quinta-feira, 31 de maio de 2018

A melhor dica do novo álbum do Arctic Monkeys que você lerá esse mês.

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E mais uma vez o Arctic Monkeys lança um novo álbum e mais uma vez eles trocam a pele, dando razão para as minhas opiniões expressas na dica que eu fiz de "AM", um álbum que continua sendo chato, medíocre e DCpcionante como poucos nessa década foram.

No entanto, 5 anos depois, um hiato e um excelente CD do The Last Shadow Puppets no meio, a melhor banda britânica desse século lança mais um álbum, de novo totalmente diferente de tudo que eles haviam lançado no passado, de novo divide opiniões e deixa muita gente brava, mas os fãs de verdade, aqueles que até hoje escutam "Whatever People Say I Am, That's What I'm Not" como se tivesse sido lançado semana passada, deverão adorar essa obra de arte.

O nome do álbum é "Tranquility Base Hotel + Casino" e como o nome indica, é um álbum conceitual, que trata de um complexo hoteleiro na lua. O conceito em si já chama a atenção, mas poderia dar muito errado, não fosse a sonoridade que o acompanha, uma mistura de rock com jazz, que faz lembrar David Bowie e Elton John no seu auge, com influencias psicodélicas, adaptadas para o novo milênio, fazendo deste álbum nada menos que um autêntico produto do século 21, mas que retorna temas e sons do passado.

E então a critica e os fãs não sabem o que pensar e buscam respostas em entrevistas e no passado da banda, criando teorias e leituras que acabam fugindo do cerne da obra, a qual eu irei expor no próximo parágrafo, mas antes um aviso: essa busca por informações e suas leituras subsequentes não estão erradas, apenas incompletas e eu não estou certo, apenas estou chegando um pouco mais perto do cerne da obra. Tire as conclusões que você quiser.

O primeiro verso do álbum é já conhecido de todo mundo que acompanhou o lançamento do álbum, semanas antes de seu vazamento: "I just wanted to be one of The Strokes/Now look at the mess you made me make" é lida como o Alex Turner retomando o seu passado, uma letra autobiográfica, mas essa leitura é apenas superficial e se afasta do conceito que o álbum representa. Esse verso pode ser lido como um verso autobiográfico do álbum, e provavelmente é, mas também se encaixa como uma luva na persona que Alex Turner encarna com esse álbum, o ricaço que cria um hotel na lua com um cassino (seu nome é Mark? Tenho que escutar mais o álbum pra definir isso). Esse mesmo ricaço é o que narra, se não todas, a maioria das musicas no álbum e é a persona assumida por Alex para esse álbum. Esqueça o motoqueiro topetudo de jaqueta de couro e óculos aviador de "AM" e aceite o ricaço perturbado classudo que construiu um hotel na lua pra se sentir no topo do mundo, achou que isso seria o suficiente, mas acabou percebendo que não era. Dessa primeira compreensão podemos traçar a narrativa principal que perpetua todo o álbum. Ele construiu o hotel, continuou se sentindo insatisfeito e, no final do álbum, ficamos sabendo que ele ainda guarda as lembranças da época em que vivia na Terra, lembranças de sua amada, provavelmente, mas pode ser a família, amigos, o inglês nos permite um nível de ambiguidade extremamente alto para essas questões, embora eu ache que o Arctic Monkeys nunca foi uma banda que tratasse de família. Esse narrador, viciado em temas de ficção cientifica desde sua infância, faz da ficção a sua realidade, todo tipo de absurdo acaba virando parte da sua rotina e ele pondera seguir outros caminhos, como virar presidente, mas também se espanta com esse mundo, que em seus sonhos de infância era ideal, mas que o assusta, como o vício em tecnologias escapistas (realidade virtual) e a crise política que assola o mundo (Não, ele não está falando do Donald Trump ou do Brexxit, isso é uma leitura muito superficial, ele está falando da oclocracia disfarçada de democracia dos tempos modernos), se tornando plenamente desgostoso com o que vê, que, no final, era o que ele sempre sonhou. Os sonhos se tornam pesadelos e talvez teria sido melhor manter tudo emoldurado em sua mente.

Acompanhando a criação desse personagem temos toda a sonoridade remanescente de filmes de ficção cientifica, instrumentos de um som tipicamente futurista, embora esse futuro tenha ficado no passado. É interessante um álbum com tal conceito numa época como a nossa, porque temos a possibilidade de ver que o futuro imaginado não é muito melhor do que a situação em que as pessoas que imaginaram esse futuro viviam.

Existem planos reais para se colonizar Marte e as mulheres cristãs ainda morrem apedrejadas em determinados locais do mundo. Pessoas mencionam Kubrick, mas deixam escapar muitas outras referencias, como "Life on a Wire", de onde saiu os acordes de teclado de "Batphone". E são esses os instrumentos importantes, teclado e piano, mas não apenas porque o álbum foi todo construído em torno deles, mas porque eles conseguem construir toda a sonoridade nostálgica e futurista-retrô que o álbum intenciona em levar aos nossos ouvidos.

A sonoridade merece um paragrafo a parte, porque ela é uma bagunça. Cada instrumento parece estar tocando uma música diferente, criando um caos, mas que acaba ganhando uma certa ordem e trazendo bons momentos para o álbum como um todo.

Arctic Monkeys é a banda britânica mais importante dessa década, eles são enormes no Reino Unido e só quem acompanhou o seu crescimento ao longo da década passada é que pode atestar isso. Eis porque "AM" é um lixo, é um álbum feito para o mercado americano, é totalmente comercial, mas a criatividade volta a fluir em "Tranquility Base Hotel + Casino" nos trazendo uma sonoridade nova para a banda, um conceito extremamente criativo e músicas diversas e bem construídas que irão satisfazer em muitos momentos diferentes.

Obrigado por voltar, Macacos Árticos.

4 pontos e meio