terça-feira, 22 de agosto de 2017

Dica cinematográfica: "Dunkirk" (2017)

dunkirk-poster

Já esperava o filme ser bom antes mesmo dele ter sido lançado, mas não esperava que “Dunkirk” fosse ser tão bom. Ainda não sei se é o melhor filme do ano (esse ano tivemos muitos excelentes filmes), mas é o mais reaça com certeza. Uma verdadeira aula de edição, é o melhor Nolan da década. Pé no chão e criando uma narrativa extremamente inteligente. Eis “Dunkirk”.

https://www.youtube.com/watch?v=F-eMt3SrfFU

Dunkirk conta um pedaço da história da Batalha de Dunquerque, um dos momentos mais marcantes para a história da Inglaterra na II Guerra Mundial, um evento onde mais ou menos 400 000 soldados aliados (não apenas britânicos) foram cercados por tropas nazistas na praia de Dunquerque, ao norte da França e logo uma operação chamada Operação Dínamo foi organizada para resgatá-los de lá. A operação tinha a estimativa de resgatar 30 000 soldados que logo subiu para 45 000, mas ao final foram resgatados mais de 300 000, com a ajuda da Marinha, da Aeronáutica e também de civis britânicos. Ao todo 5 países participaram da operação, mas o filme de Nolan é extremamente nacionalista e nos apresenta apenas os seus últimos dias.

É difícil falar de Dunkirk sem entregar muito da história, então prepare-se para spoilers e antes vale um questionamento: por que não traduziram o nome? Dunkirk é o nome da região francesa em inglês e tem um nome em português há muito tempo. Imagino que seja exigência da produtora, mas se eu fosse da distribuidora brasileira teria insistido na tradução do nome, ia ser mais bonito.

Enfim, o filme é narrado de 3 pontos de vista diferentes, cada um seguindo sua própria linha do tempo. Primeiro, o dos soldados na praia de Dunquerque, o principal deles já preso lá há uma semana e morrendo de vontade de ir embora. O segundo é narrado do ponto de vista do sr. Dawson, um civil dono de um barco de passeio que se voluntariou para resgatar soldados na costa de Dunquerque e vai para lá junto de seu filho Peter e o amigo de seu filho, George. E o terceiro e último parte do ponto de vista de 3 pilotos de avião da Real Força Aérea (RAF, no original), que estão indo para Dunquerque a fim de garantir a sobrevivência dos soldados presos lá.

Bodega Bay

É fácil compreender os princípios por trás desses três pontos de vista: são os elementos, terra, água e ar, que juntos trabalham para no final do filme criar o fogo da esperança, que nos renova e nos iniciar novamente. A narrativa desse filme é simplesmente linda e cada uma das três histórias tem seus personagens com dramas, vontades e defeitos, todas centralizadas em 3 personagens. 3 pontinhos só por ter respeitado a "regra dos 3".

E por falar em defeitos existem muitos personagens defeituosos, porém humanos. O personagem de Cillian Murphy é um tremendo de um covarde e o personagem de Harry Styles é um tremendo filho da puta (na falta de palavra de melhor). Ambos têm seus medos e vaidades, mas aos poucos vamos compreendendo os seus pontos de vista, apesar de ser quase impossível concordar com eles, um está traumatizado e o outro é um nacionalista orgulhoso. E são esses elementos que tornam o filme uma obra crível, real, muito mais pé no chão, que é o que o Nolan faz de melhor. Quando ele enveredou para a ficção científica eu até gostava dos filmes, mas não achava tudo isso que seus fãs acham e acho que desde “A Origem” ele não fazia um filme que fosse mais que 7/10. Agora, num filme de guerra, ele não pode inventar muito e o roteiro não abre espaço para muito enrolação e lição de moral, apesar do filme ter os seus momentos, em cada uma das narrativas, onde os personagens expõem verbalmente a moral da história, o que quebra um pouco a naturalidade do momento, mas eu não sei se é porque as frases são muito heroicas e com intenção de causar um efeito no espectador ou se é porque o filme tem poucos diálogos em toda a sua extensão de quase 2 horas e acabamos achando estranho os personagens falando tanto. Preciso assistir esse filme mais vezes.

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A moral universal da história é claramente a união, mas há um aspecto no pano de fundo do filme que me deixou com uma pulga atrás da orelha e eu cheguei à conclusão de que esse é o filme mais reaça do ano; é o nacionalismo britânico. O filme é todo narrado do ponto de vista dos britânicos, alguém que não conhece história vai pensar que a Operação Dínamo (na verdade, ele(a) nem vai saber que o nome da operação é Dínamo) foi executada apenas por britânicos e que os franceses foram salvos só depois (na vida real, a confusão era muito maior e entrava todo mundo naqueles barcos). Isso tudo é para elevar a moral da nação britânica como um todo, é um filme que eleva o espírito britânico que até na derrota sai vitorioso, é um povo que honra seus soldados e que tem soldados que desejam servir sua nação a qualquer custo. Dunkirk é um filme que só tem efeito num período pós-Brexxit e é claro que o Brexxit se fortalece com isso. Esse subtexto pode ofender as sensibilidades de muitos SJW globalistas por aí, mas eu, pessoalmente, acho a mensagem muito importante e gostaria de ver mais disso no cinema francês, polonês e até italiano ou brasileiro, por que não?

Fora esses aspectos narrativos, ainda temos a aula de cinema que esse filme nos oferece, especificamente a aula de edição. Os três pontos de vista se intercalam em momentos cruciais que mantém a tensão e criam facilmente uma linha temporal na mente do espectador. É claro que lá pro final, a edição, como todo filme do Nolan se torna frenética e isso nas cenas de batalha é muito bom, mas acaba criando uma certa confusão na cabeça de quem acompanha. No entanto, se você prestou atenção em todo o filme, principalmente em seu começo, vai conseguir manter a linha do tempo em sua cabeça.

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Ainda assim, eu gostaria que as cenas no trem durassem um ou dois segundos a mais, só por efeito dramático mesmo.

A trilha sonora frenética e desconexa do Hans Zimmer está brilhante nesse filme e ouso dizer que é ainda melhor que Interstellar (a única coisa realmente brilhante naquele filme, na minha humilde opinião) e talvez vire dica por aqui também.

Em suma, “Dunkirk” é um dos melhores filmes do ano, uma obra fantástica e brilhante como poucas podem ser. Que ano, senhores... que ano!

5 pontos